Propostas serão redigidas hoje

20 de agosto de 2010 - 12:25

A ICID 18 chegou ao seu final. As discussões foram feitas e a conferência produzirá, hoje, a declaração de Fortaleza, com as deliberações que serão encaminhadas à Rio 20 (2012) e, antes, à Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro próximo. Após quatro dias de evento, conclui-se que a comunidade científica internacional já não aceita, passivamente, a desconsideração política. A ciência deve fundamentar decisões governamentais.
“A humanidade está realizando uma experiência involuntária, descontrolada e universal cujas últimas consequencias só podem ser equiparadas a uma guerra mundial nuclear”. A ideia por detrás da sentença é atualíssima, mas não foi dita na ICID 18. A frase foi criada há incríveis 22 anos, na Conferência Mundial sobre Mudanças da Atmosfera, em junho de 1988, em Toronto (Canadá).
O tempo passa, a ciência se preocupa, mas nada muda. Discursos antigos permanecem atuais. Para Michael H. Glantz, é preciso escancarar o porquê. “Dizem que não há dinheiro pra essas questões, mas é importante dizer que o que não há é vontade dos líderes. Os problemas ambientais são conhecidos, já há muito tempo. Sabemos de tudo isso e não fazemos nada”.

Michael é diretor do Consortium for Capacity Building, um órgão da Universidade do Colorado (EUA) que trabalha informações sobre clima, água e tempo. Ele critica a inércia da política global, que não responde aos alertas científicos. Essa crítica, de fato, perpassou toda a ICID 18. O alerta geral foi a necessária aproximação entre cientistas e políticos, única saída aparente para a crise ambiental (e humana) global . “Não estamos aprendendo as lições, estamos apenas identificando-as. Em verdade, nenhuma recomendação deve ser elaborada sem a definição sobre o que pode acontecer se você não adotá-la”, disse Michael.

Tragédias anunciadas
Para o hidrólogo tailandês S.H.M. Fakhruddin, do Regional Integrated Multi-Hazard Early Warning System (Sistema Integrado Regional de Alertas Precoces Multi-Riscos, em tradução livre), duas das maiores tragédias naturais dos últimos anos poderiam ter sido evitadas. Em 2008, o ciclone Nargis matou mais de 80 mil pessoas apenas em Mianmar, mas foi previsto com dias de antecedência. E as enchentes que já deixaram quase cinco milhões de desabrigados no Paquistão, nas últimas semanas, foram previstas com dois dias de antecedência, mas nunca chegaram às comunidades.

Então, por que, com bilhões de dólares investidos em tecnologias de sistemas de alertas (os chamados EWS), catástrofes continuam a surpreender populações mundo afora? Para Fakhruddin, três motivos podem explicar as falhas: as advertências não são entendidas totalmente pelos cientistas; elas são entendidas, mas ignoradas por inexperiência; ou elas são entendidas, não são ignoradas, mas os governos não respondem por não terem a estrutura necessária. “E então, a informação que você gerou gastando bilhões de dólares não vai servir para nada”, conclui Fakhruddin.

Para Michael H. Glantz, o mal é, acima de tudo, social. “O clima não é a única coisa que muda. Nossa preocupação tem que ser com a dimensão social das mudanças climáticas. E devemos pensar sobre a dimensão climática das mudanças sociais”, diz, apontando claramente para a problemática social como uma das raízes e grande consequência do aquecimento global. Ele termina com um alerta: “Lembrem-se, não há planeta B. Pode haver todos os planos B, mas não há outro planeta”.

O professor Marcos Filardi, do Seminário Interdisciplinar sobre a Fome e o Direito à Alimentação da Universidade de Buenos Aires (Argentina), sintetiza o sentimento generalizado dos cientistas da ICID 18: “Hoje temos seca, mas seca de coragem. Escassez, mas não de comida, de desejo político”.
 

 

Fonte:
Jornal O estado-CE
Editoria: Cidade
Data: 20/08/10